O
Mito da Caverna, escrito por Platão no Livro VII, da República, traz a
narrativa do diálogo de Sócrates com Glauco e Adimato, onde Platão discute
sobre a teoria do conhecimento e narra a história de prisioneiros de uma
caverna que, acorrentados desde sempre, acreditam na realidade das sombras que
passam em frente as chamas da luz de uma fogueira. Contudo, em determinada
ocasião, um deles consegue se libertar e sair da caverna, descobrindo então a
realidade e tendo acesso ao conhecimento do mundo que o cerca. Entretanto, ao
retornar à caverna com o intuito de literalmente libertar seus colegas, estes
não aceitam o que ouvem e acabam com a vida do prisioneiro que havia se
libertado.
É de
se concluir que os prisioneiros estavam mais presos às suas crenças e medos do
que às suas correntes, haja vista que passaram tanto tempo a ver sombras que
não aceitaram a possibilidade de existir realidade diversa da que conheciam e onde se sentiam confortáveis.
A
alegoria da caverna nos mostra que o pensamento de Platão divide o mundo em
duas realidades, quais sejam, a sensível, que traduz o mundo da imperfeição,
pois é percebida pelos sentidos; e a inteligível, que traduz o mundo das ideias
e vai de encontro à verdade possível para o homem. Quer dizer que todo homem
deveria ir em busca do mundo da verdade para chegar ao bem maior da vida,
almejar o conhecimento das realidades que o cercam, a fim de não serem enganados com a transitoriedade dos sentidos.
De
tal forma, transportando a alegoria da caverna para os dias atuais, podemos
questionar quais são as cavernas com as quais nos envolvemos e nos aprisionamos
pensando serem verdade.
Talvez
estejamos vivendo a era da manipulação e alienação linguísticas, achando que
somos livres em meio à tanta facilidade de comunicação e democracia. Talvez
somente estejamos acorrentados, mas agora com maior variedade de sombras a nos
iludir.
Diante
de tal reflexão, podemos dizer que atualmente os meios de comunicação são os
detentores do poder e quem possui poder garante o resultado da ação do outro.
Do outro que acredita na sombra que vê, sem questionamentos.
Assim,
os meios de comunicação ditam valores, manipulam o inconsciente coletivo e
ditam comportamentos. Uma reportagem por exemplo, muitas vezes pode ser
tendenciosa, revelando apenas recortes e não os fatos em sua totalidade,
somente o que lhe é conveniente, em consonância com seus interesses e a grande
massa acredita, sem qualquer reflexão, trazendo à baila o contraste entre o
conhecimento da verdade e a informação ilusória e manipuladora.
Outrossim,
pode-se dizer que as novelas também distorcem a realidade, já que ditam
modismos e produzem gêneros, fazendo com que as pessoas reproduzam
comportamentos sem perguntarem a si mesmas se tal atitude faz parte de sua
verdade ou não. As pessoas não conhecem a sua verdade, não são sua própria
referência, então seguem vendo as chamas da caverna, mas sem enxergar que há um
mundo fora dali.
Por
outro lado, podemos pensar que os meios de comunicação trouxeram evolução,
assim como as redes sociais, mas será que o problema está no instrumento ou em
quem o recebe e conduz?
Será que o problema está na forma como o homem se limita
justamente por não se conhecer e se conformar com as migalhas que lhe oferecem?
As correntes invisíveis que os modelos e a inconsciência de si lhe impõem.
Quando
pensamos em meios de comunicação podemos associar tal ideia ao dinheiro e ao
poder, que estão sempre ligados à manipulação, pois movem o nosso sistema,
controlam a realidade que desejam que o homem acredite como única possível. De
tal modo, não há interesse no despertar da consciência das pessoas. Nesse
ponto, podemos dizer que o papel das redes sociais pode assumir duplo sentido,
alienando ou despertando as pessoas. O que você escolhe?
Talvez
o mito da caverna tenha muito a ver com filmes como Matrix e A Ilha, assim como
com a obra de George Orwell, 1984, onde o “Estado” dominava a sociedade de
diversas formas, sendo uma delas a proibição da escrita, impondo um vocabulário
denominado “novafala”, onde constantemente o nome das coisas era modificado,
assim como o sentido, as palavras eram reduzidas para que as pessoas não pudessem se
manifestar e desta forma o controle sobre elas era cada vez maior até chegar
a sua totalidade.
Posto
isso, pode-se dizer que a realidade distorcida é ausência de razão e de auto
conhecimento. Opinamos e julgamos, mas sem passar pelo crivo do mundo
inteligível, somos reféns das emoções. Não sabemos dosar os mundos e tirar o
melhor deles. Vê-se o mundo pela óptica de outras pessoas.
A
ausência de reflexão e busca pela verdade faz com que os que estão na caverna
acreditem que estão seguros na luz das chamas da fogueira, o que causa inércia
de questionamento e faz as pessoas se acharem vítimas e desejarem receber um
mundo sempre pronto, assim como é a caverna. Na realidade se tornam vítimas de
si mesmas e do sistema, assim, os meios de comunicação e os detentores do poder se
aproveitam da lacuna que as pessoas têm de si mesmas.
Ainda
hoje, grande parte da sociedade é prisioneira da caverna, e olha para aqueles
que fogem do sistema e do controle e os julgam, os “matam” com críticas e
julgamentos. O sistema tenta abafá-los manipulando informação contra eles. A grande massa social quer que todos fiquem dentro da caverna a fim de se sentirem seguros em seu mundo de sombras.
Em
suas cavernas, os prisioneiros têm medo da mudança, são cômodos e vivem
apoiados em uma falsa segurança, no conhecimento raso e ilusório.
Assim,
o mito da caverna é tão atual quanto toda a tecnologia que nos cerca.
A
sociedade vem, ao longo da história, lutando por liberdade, mas será que
sabem o que fazer com essa liberdade? Será preciso caminhar
em tal busca sob o solo da verdade e do conhecimento real.
Será
que nessa busca pela liberdade e confusão de valores, não estamos voltando para
a caverna a fim de observar as sombras?
Vivemos
o tempo dos excessos para aliviar ansiedades, verdades e responsabilidades, pois, o
conhecimento é um caminho sem volta e talvez, quanto maior seja a evolução,
maior seja a solidão e o homem ainda não saiba viver bem consigo mesmo e por
isso ceda à companhia, ilusões e ideias dos colegas prisioneiros da caverna.
O
quanto ficar preso às correntes da caverna é conveniente?
As
redes sociais hoje, trazem a falsa condução ao mundo das ideias, pois mobilizam
grande potencial, mas também exercem controle e manipulação. É preciso estar
sempre atento. Utilizar as chamas da fogueira da caverna para iluminar os
próprios passos rumo à verdade.
Isso
porque, temos excesso de informações e opiniões, mas falta de conhecimento e sabedoria. O homem vem
caminhando através da informação enquanto a vida acontece em algum lugar onde
ele não consegue levantar os olhos para contemplá-la e participar
efetivamente do processo.
A
porta da caverna sempre estará aberta. O homem não pode se entregar aos
extremos, deve buscar e encontrar o ponto de equilíbrio entre a consciência de
si mesmo e daquilo que o cerca. Entender o limite e ir além dele.
Aprender a
olhar o real diferente dos outros, a fim de ser sua própria referência e sua
própria chama, ser a luz e a sombra a iluminar os próprios passos na busca da
verdade e da evolução.
Mas,
afinal... estamos fora da Caverna?